terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Oh, vinde, adoremos o Salvador!


Homilia de Bento XVI no Natal do Senhor




Amados irmãos e irmãs!
A beleza deste Evangelho não cessa de tocar o nosso coração: uma beleza que é esplendor da verdade. Não cessa de nos comover o facto de Deus Se ter feito menino, para que nós pudéssemos amá-Lo, para que ousássemos amá-Lo, e, como menino, Se coloca confiadamente nas nossas mãos. Como se dissesse: Sei que o meu esplendor te assusta, que à vista da minha grandeza procuras impor-te a ti mesmo. Por isso venho a ti como menino, para que Me possas acolher e amar.
Sempre de novo me toca também a palavra do evangelista, dita quase de fugida, segundo a qual não havia lugar para eles na hospedaria. Inevitavelmente se põe a questão de saber como reagiria eu, se Maria e José batessem à minha porta. Haveria lugar para eles? E recordamos então que esta notícia, aparentemente casual, da falta de lugar na hospedaria que obriga a Sagrada Família a ir para o estábulo, foi aprofundada e referida na sua essência pelo evangelista João nestes termos: «Veio para o que era Seu, e os Seus não O acolheram» (Jo 1, 11). Deste modo, a grande questão moral sobre o modo como nos comportamos com os prófugos, os refugiados, os imigrantes ganha um sentido ainda mais fundamental: Temos verdadeiramente lugar para Deus, quando Ele tenta entrar em nós? Temos tempo e espaço para Ele? Porventura não é ao próprio Deus que rejeitamos? Isto começa pelo facto de não termos tempo para Deus. Quanto mais rapidamente nos podemos mover, quanto mais eficazes se tornam os meios que nos fazem poupar tempo, tanto menos tempo temos disponível. E Deus? O que diz respeito a Ele nunca parece uma questão urgente. O nosso tempo já está completamente preenchido. Mas vejamos o caso ainda mais em profundidade. Deus tem verdadeiramente um lugar no nosso pensamento? A metodologia do nosso pensamento está configurada de modo que, no fundo, Ele não deva existir. Mesmo quando parece bater à porta do nosso pensamento, temos de arranjar qualquer raciocínio para O afastar; o pensamento, para ser considerado «sério», deve ser configurado de modo que a «hipótese Deus» se torne supérflua. E também nos nossos sentimentos e vontade não há espaço para Ele. Queremo-nos a nós mesmos, queremos as coisas que se conseguem tocar, a felicidade que se pode experimentar, o sucesso dos nossos projectos pessoais e das nossas intenções. Estamos completamente «cheios» de nós mesmos, de tal modo que não resta qualquer espaço para Deus. E por isso não há espaço sequer para os outros, para as crianças, para os pobres, para os estrangeiros. A partir duma frase simples como esta sobre o lugar inexistente na hospedaria, podemos dar-nos conta da grande necessidade que há desta exortação de São Paulo: «Transformai-vos pela renovação da vossa mente» (Rm 12, 2). Paulo fala da renovação, da abertura do nosso intelecto (nous); fala, em geral, do modo como vemos o mundo e a nós mesmos. A conversão, de que temos necessidade, deve chegar verdadeiramente até às profundezas da nossa relação com a realidade. Peçamos ao Senhor para que nos tornemos vigilantes quanto à sua presença, para que ouçamos como Ele bate, de modo suave mas insistente, à porta do nosso ser e da nossa vontade. Peçamos para que se crie, no nosso íntimo, um espaço para Ele e possamos, deste modo, reconhecê-Lo também naqueles sob cujas vestes vem ter connosco: nas crianças, nos doentes e abandonados, nos marginalizados e pobres deste mundo.
Na narração do Natal, há ainda outro ponto que gostava de reflectir juntamente convosco: o hino de louvor que os anjos entoam depois de anunciar o Salvador recém-nascido: «Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens do seu agrado». Deus é glorioso. Deus é pura luz, esplendor da verdade e do amor. Ele é bom. É o verdadeiro bem, o bem por excelência. Os anjos que O rodeiam transmitem, primeiro, a pura e simples alegria pela percepção da glória de Deus. O seu canto é uma irradiação da alegria que os inunda. Nas suas palavras, sentimos, por assim dizer, algo dos sons melodiosos do céu. No canto, não está subjacente qualquer pergunta sobre a finalidade; há simplesmente o facto de transbordarem da felicidade que deriva da percepção do puro esplendor da verdade e do amor de Deus. Queremos deixar-nos tocar por esta alegria: existe a verdade; existe a pura bondade; existe a luz pura. Deus é bom; Ele é o poder supremo que está acima de todos os poderes. Nesta noite, deveremos simplesmente alegrar-nos por este facto, juntamente com os anjos e os pastores.
E, com a glória de Deus nas alturas, está relacionada a paz na terra entre os homens. Onde não se dá glória a Deus, onde Ele é esquecido ou até mesmo negado, também não há paz. Hoje, porém, há correntes generalizadas de pensamento que afirmam o contrário: as religiões, mormente o monoteísmo, seriam a causa da violência e das guerras no mundo; primeiro seria preciso libertar a humanidade das religiões, para se criar então a paz; o monoteísmo, a fé no único Deus, seria prepotência, causa de intolerância, porque pretenderia, fundamentado na sua própria natureza, impor-se a todos com a pretensão da verdade única. É verdade que, na história, o monoteísmo serviu de pretexto para a intolerância e a violência. É verdade que uma religião pode adoecer e chegar a contrapor-se à sua natureza mais profunda, quando o homem pensa que deve ele mesmo deitar mão à causa de Deus, fazendo assim de Deus uma sua propriedade privada. Contra estas deturpações do sagrado, devemos estar vigilantes. Se é incontestável algum mau uso da religião na história, não é verdade que o «não» a Deus restabeleceria a paz. Se a luz de Deus se apaga, apaga-se também a dignidade divina do homem. Então, este deixa de ser a imagem de Deus, que devemos honrar em todos e cada um, no fraco, no estrangeiro, no pobre. Então deixamos de ser, todos, irmãos e irmãs, filhos do único Pai que, a partir do Pai, se encontram interligados uns aos outros. Os tipos de violência arrogante que aparecem então com o homem a desprezar e a esmagar o homem, vimo-los, em toda a sua crueldade, no século passado. Só quando a luz de Deus brilha sobre o homem e no homem, só quando cada homem é querido, conhecido e amado por Deus, só então, por mais miserável que seja a sua situação, a sua dignidade é inviolável. Na Noite Santa, o próprio Deus Se fez homem, como anunciara o profeta Isaías: o menino nascido aqui é «Emmanuel – Deus-connosco» (cf. Is 7, 14). E verdadeiramente, no decurso de todos estes séculos, não houve apenas casos de mau uso da religião; mas, da fé no Deus que Se fez homem, nunca cessou de brotar forças de reconciliação e magnanimidade. Na escuridão do pecado e da violência, esta fé fez entrar um raio luminoso de paz e bondade que continua a brilhar.
Assim, Cristo é a nossa paz e anunciou a paz àqueles que estavam longe e àqueles que estavam perto (cf. Ef 2, 14.17). Quanto não deveremos nós suplicar-Lhe nesta hora! Sim, Senhor, anunciai a paz também hoje a nós, tanto aos que estão longe como aos que estão perto. Fazei que também hoje das espadas se forjem foices (cf. Is 2, 4), que, em vez dos armamentos para a guerra, apareçam ajudas para os enfermos. Iluminai a quantos acreditam que devem praticar violência em vosso nome, para que aprendam a compreender o absurdo da violência e a reconhecer o vosso verdadeiro rosto. Ajudai a tornarmo-nos homens «do vosso agrado»: homens segundo a vossa imagem e, por conseguinte, homens de paz.
Logo que os anjos se afastaram, os pastores disseram uns para os outros: Coragem! Vamos até lá, a Belém, e vejamos esta palavra que nos foi mandada (cf. Lc 2, 15). Os pastores puseram-se apressadamente a caminho para Belém – diz-nos o evangelista (cf. 2, 16). Uma curiosidade santa os impelia, desejosos de verem numa manjedoura este menino, de quem o anjo tinha dito que era o Salvador, o Messias, o Senhor. A grande alegria, de que o anjo falara, apoderara-se dos seus corações e dava-lhes asas.
Vamos até lá, a Belém: diz-nos hoje a liturgia da Igreja. Trans-eamus – lê-se na Bíblia latina – «atravessar», ir até lá, ousar o passo que vai mais além, que faz a «travessia», saindo dos nossos hábitos de pensamento e de vida e ultrapassando o mundo meramente material para chegarmos ao essencial, ao além, rumo àquele Deus que, por sua vez, viera ao lado de cá, para nós. Queremos pedir ao Senhor que nos dê a capacidade de ultrapassar os nossos limites, o nosso mundo; que nos ajude a encontrá-Lo, sobretudo no momento em que Ele mesmo, na Santa Eucaristia, Se coloca nas nossas mãos e no nosso coração.
Vamos até lá, a Belém! Ao dizermos estas palavras uns aos outros, como fizeram os pastores, não devemos pensar apenas na grande travessia até junto do Deus vivo, mas também na cidade concreta de Belém, em todos os lugares onde o Senhor viveu, trabalhou e sofreu. Rezemos nesta hora pelas pessoas que actualmente vivem e sofrem lá. Rezemos para que lá haja paz. Rezemos para que Israelitas e Palestinianos possam conduzir a sua vida na paz do único Deus e na liberdade. Peçamos também pelos países vizinhos – o Líbano, a Síria, o Iraque, etc. – para que lá se consolide a paz. Que os cristãos possam conservar a sua casa naqueles países onde teve origem a nossa fé; que cristãos e muçulmanos construam, juntos, os seus países na paz de Deus.
Os pastores apressaram-se… Uma curiosidade santa e uma santa alegria os impelia. No nosso caso, talvez aconteça muito raramente que nos apressemos pelas coisas de Deus. Hoje, Deus não faz parte das realidades urgentes. As coisas de Deus – assim o pensamos e dizemos – podem esperar. E todavia Ele é a realidade mais importante, o Único que, em última análise, é verdadeiramente importante. Por que motivo não deveríamos também nós ser tomados pela curiosidade de ver mais de perto e conhecer o que Deus nos disse? Supliquemos-Lhe para que a curiosidade santa e a santa alegria dos pastores nos toquem nesta hora também a nós e assim vamos com alegria até lá, a Belém, para o Senhor que hoje vem de novo para nós. Amém.

domingo, 25 de novembro de 2012

Ordenação diaconal do Ir. Uilaci de Almeida
Paróquia de São José Operário
12 de dezembro de 2012

    Fico extasiada diante da nossa Mãe e Fundadora, a Bem-aventurada Maria Pia. Ela prometeu e não desistiu até ver realizado o grande sonho de ter, em seu "pequeno jardim", o ramo masculino, para somar forças, dedicação e vida na propagação da Face de Jesus no mundo inteiro, juntamente com as irmãs que já temos um caminho percorrido. 
     A Madre não pôde realizar esse sonho enquanto estava entre nós, mas ela o fez agora, junto de seu Esposo. Recordo as suas palavras ao seu irmão Plínio, quando escrevendo-lhe, expressa o desejo de ter os Religiosos da Sagrada Face, dizendo-lhe que moveria terra e céus para concretizá-lo. Hoje, eis-nos aqui, agradecendo a Deus o dom desse pequeno broto, que cresce entre nós, e, sobretudo, agradecendo à nossa Fundadora, pela intercessão, persistência e insistência junto a Jesus na realizaçaõ desse projeto novo!
     Certamente, nesse percurso, não faltaram provações, questionamentos, inquietações... Quantas portas fechadas, quantos "nãos" ouvidos, quanta descrença nesse pequeno broto que tentava se erguer, buscando os raios do Sol. Sim, o Sol não tardou em dar-lhe o vigor necessário para crescer. É verdade que esse broto está crescendo segundo o tempo de Deus, da sua graça que não falha, que o tem sustentado em todas as provações. Mas, já vislumbramos, num futuro próximo, os frutos que, certamente, virão.
     Obrigada, querida Mãe, por caminhar com teus filhos e filhas, por trabalhar incansavelmente junto de Jesus para dar continuidade aos projetos que não lhe foi possível realizar em vida. Obrigada por esse fruto que já temos em mãos: a ordenação diaconal de Ir. Uilaci. 
     Obrigada Ir. Uilaci pelo seu sim, por arriscar a sua juventude, suas forças, seus sonhos nesse projeto masteniano, por acreditar, como Abraão, "contra toda esperança", que esse projeto era querido por Deus. Obrigada por ter sido o primeiro a abrir caminho, como homem à frente de seu tempo, deixando o percurso menos árduo aos que empreenderam e empreenderão suas vidas para que a Face de Jesus seja conhecida, reparada, restabelecida e amada por toda homem e mulher em todo o mundo.
       Bem-aventurada Maria  Pia Mastena, rogai por nós!!!
      

Cristo Rei do universo

Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo
Basílica Vaticana
Domingo, 25 de novembro de 2012

Senhores Cardeais,
Venerados Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio,
Amados irmãos e irmãs!

A solenidade de Jesus Cristo Rei do universo, que hoje coroa o Ano Litúrgico, vê-se enriquecida com a recepção no Colégio Cardinalício de seis novos membros, que convidei, como é tradição, para concelebrar comigo a Eucaristia nesta manhã. A cada um deles dirijo a minha saudação mais cordial, agradecendo ao Cardeal James Michael Harvey as amáveis palavras que em nome de todos me dirigiu. Saúdo os outros Purpurados e todos os Prelados presentes, bem como as ilustres Autoridades, os Senhores Embaixadores, os sacerdotes, os religiosos e todos os fiéis, especialmente quantos vieram das dioceses que estão confiadas ao cuidado pastoral dos novos Cardeais.

Neste último domingo do Ano Litúrgico, a Igreja convida-nos a celebrar Jesus Cristo como Rei do universo; chama-nos a dirigir o olhar em direção ao futuro, ou melhor em profundidade, para a meta última da história, que será o reino definitivo e eterno de Cristo. Estava com o Pai no início, quando o mundo foi criado, e manifestará plenamente o seu domínio no fim dos tempos, quando julgar todos os homens. As três leituras de hoje falam-nos desse reino. No texto evangélico que ouvimos, tirado do Evangelho de São João, Jesus encontra-Se numa situação humilhante – a de acusado – diante do poder romano. Foi preso, insultado, escarnecido, e agora os seus inimigos esperam obter a sua condenação ao suplício da cruz. Apresentaram-No a Pilatos como alguém que aspira ao poder político, como o pretenso rei dos judeus. O procurador romano faz a própria investigação e interroga Jesus: "Tu és rei dos judeus?" (Jo 18, 33). Na resposta a esta pergunta, Jesus esclarece a natureza do seu reino e da própria messianidade, que não é poder terreno, mas amor que serve; afirma que o seu reino de modo algum se confunde com qualquer reino político: "A minha realeza não é deste mundo (...) o meu reino não é de cá" (v. 36).

É claro que Jesus não tem nenhuma ambição política. Depois da multiplicação dos pães, o povo, entusiasmado com o milagre, queria pegar n’Ele e fazê-Lo rei, para derrubar o poder romano e assim estabelecer um novo reino político, que seria considerado como o reino de Deus tão esperado. Mas Jesus sabe que o reino de Deus é de gênero totalmente diverso; não se baseia sobre as armas e a violência. E é justamente a multiplicação dos pães que se torna, por um lado, sinal da sua messianidade, mas, por outro, assinala uma viragem decisiva na sua atividade: a partir daquele momento aparece cada vez mais claro o caminho para a Cruz; nesta, no supremo ato de amor, resplandecerá o reino prometido, o reino de Deus. Mas a multidão não entende, fica decepcionada, e Jesus retira-Se para o monte sozinho para rezar, para falar com o Pai (cf. Jo 6, 1-15). Na narração da Paixão, vemos como os próprios discípulos, apesar de terem partilhado a vida com Jesus e ouvido as suas palavras, pensavam em um reino político, instaurado mesmo com o uso da força. No Getsêmani, Pedro desembainhara a sua espada e começou a combater, mas Jesus deteve-o (cf. Jo 18, 10-11); não quer ser defendido com as armas, mas deseja cumprir a vontade do Pai até ao fim e estabelecer o seu reino, não com as armas e a violência, mas com a aparente fragilidade do amor que dá a vida. O reino de Deus é um reino completamente diferente dos reinos terrenos.
Por isso, diante de um homem indefeso, frágil, humilhado como se apresenta Jesus, um homem de poder como Pilatos fica surpreendido – surpreendido, porque ouve falar de um reino, de servidores – e faz uma pergunta, a seu ver paradoxal: "Logo, Tu és rei!". Que tipo de rei pode ser um homem naquelas condições!? Mas Jesus responde afirmativamente: "É como dizes: Eu sou rei! Para isto nasci, para isto vim ao mundo: para dar testemunho da Verdade. Todo aquele que vive da Verdade escuta a minha voz" (18, 37). Jesus fala de rei, de reino, referindo-Se não ao domínio mas à verdade. Pilatos não entende: poderá haver um poder que não se obtenha com meios humanos? Um poder que não corresponda à lógica do domínio e da força? Jesus veio para revelar e trazer uma nova realeza: a realeza de Deus. Veio para dar testemunho da verdade de um Deus que é amor (cf. 1 Jo 4, 8.16) e que deseja estabelecer um reino de justiça, de amor e de paz (cf. Prefácio). Quem está aberto ao amor, escuta este testemunho e acolhe-o com fé, para entrar no reino de Deus.

Encontramos esta perspectiva na primeira leitura que ouvimos. O profeta Daniel prediz o poder de um personagem misterioso colocado entre o céu e a terra: "Vi aproximar-se, sobre as nuvens do céu, um ser semelhante a um filho de homem. Avançou até ao Ancião, diante do qual o conduziram. Foram-lhe dadas as soberanias, a glória e a realeza. Todos os povos, todas as nações e as gentes de todas as línguas o serviram. O seu império é um império eterno que não passará jamais, e o seu reino nunca será destruído" (7, 13-14). São palavras que prevêem um rei que domina de mar a mar até aos confins da terra, com um poder absoluto, que nunca será destruído. Esta visão do profeta, uma visão messiânica, é esclarecida e realiza-se em Cristo: o poder do verdadeiro Messias – poder que não mais desaparece e nunca será destruído – não é o poder dos reinos da terra que surgem e caem, mas o poder da verdade e do amor. Assim entendemos como a realeza, anunciada por Jesus nas parábolas e revelada aberta e explicitamente diante do Procurador romano, é a realeza da verdade, a única que dá a todas as coisas a sua luz e grandeza.
Na segunda leitura, o autor do Apocalipse afirma que também nós participamos na realeza de Cristo. Na aclamação dirigida "Àquele que nos ama e nos purificou dos nossos pecados com o seu sangue", declara que Ele "fez de nós um reino, sacerdotes para Deus e seu Pai" (1, 5-6). Aqui está claro também que se trata de um reino fundado na relação com Deus, com a verdade, e não de um reino político. Com o seu sacrifício, Jesus abriu-nos a estrada para uma relação profunda com Deus: n’Ele tornamo-nos verdadeiros filhos adotivos, participando assim da sua realeza sobre o mundo. Portanto, ser discípulos de Jesus significa não se deixar fascinar pela lógica mundana do poder, mas levar ao mundo a luz da verdade e do amor de Deus. Depois o autor do Apocalipse estende o olhar até à segunda vinda de Jesus – quando Ele voltar para julgar os homens e estabelecer para sempre o reino divino – e recorda-nos que a conversão, como resposta à graça divina, é a condição para a instauração desse reino (cf. 1, 7). É um vigoroso convite dirigido a todos e cada um: converter-se sem cessar ao reino de Deus, ao domínio de Deus, da Verdade, na nossa vida. Pedimo-lo diariamente na oração do "Pai nosso" com as palavras "Venha a nós o vosso reino", que equivale a dizer a Jesus: Senhor, fazei que sejamos vossos, vivei em nós, reuni a humanidade dispersa e atribulada, para que em Vós tudo se submeta ao Pai da misericórdia e do amor.

A vós, amados e venerados Irmãos Cardeais – penso de modo particular àqueles que foram criados ontem –, se confia esta responsabilidade impelente: dar testemunho do reino de Deus, da verdade. Isso significa fazer sobressair sempre a prioridade de Deus e da sua vontade face aos interesses do mundo e dos seus poderes. Fazei-vos imitadores de Jesus, que diante de Pilatos, na situação humilhante descrita pelo Evangelho, manifestou a sua glória: a glória de amar até ao fim, dando a própria vida pelas pessoas amadas. Esta é a revelação do reino de Jesus. E por isso, com um só coração e uma só alma, rezemos: "Adveniat regnum tuum". Amen.


quarta-feira, 27 de junho de 2012

Homilia do cardeal José Saraiva Martins na missa de beatificação.

“Tudo o que somos e tudo o que possuímos, devemos empenhá-lo e pô-lo ao serviço do Senhor e do nosso próximo, numa palavra, devemos fazer com que se torne caridade!” “Por este motivo Jesus louva os dois homens que souberam fazer frutificar os talentos recebidos: foi precisamente isto que fizeram os santos, na lógica divina do amor e da doação total de si.
“A vida do cristão é verdadeiramente uma longa vigília, um tempo de espera do Senhor. Mas nós, como recorda o Apóstolo, somos "todos filhos da luz" (Ts 5, 5) porque mediante o Batismo somos inseridos em Cristo, Luz do mundo. Luz bem visível e iluminadora foi a que fez brilhar a beata Maria Pia Mastena, a qual viveu a sua condição de religiosa, na busca contínua de levar ao rosto dos irmãos, o esplendor da Sagrada Face, por ela tão amada.” “O rosto do homem, sobretudo quando é deturpado pelo pecado e pelas misérias deste mundo, só poderá resplandecer quando for conforme ao de Cristo, martirizado na Cruz e transfigurado pela glória do Pai. Madre Mastena sentiu a forte tensão missionária de "levar o Rosto de Jesus aos homens de todo o mundo, aos lugares mais pobres e abandonados". 

 “Olhando para a santidade da beata Madre Mastena é legítimo reconhecer nela uma grande artista que soube imprimir em si mesma a Imagem de Cristo, assumindo, mediante a prática de tantas virtudes, o "Rosto dos rostos", o Rosto mais belo que possa haver entre os filhos dos homens.” “Ela conseguiu fazer transparecer, pelas suas características pessoais, o Rosto do Senhor nas expressões da misericórdia, da caridade, do perdão, do serviço a tempo inteiro às pessoas mais necessitadas.” Com grandes sacrifícios, dificuldades, fé e tenacidade, em 1936, a beata Mastena fundou a Congregação das Religiosas da Sagrada Face, transmitindo às suas irmãs de hábito o seu projeto de vida, que em síntese definia: "propagar, reparar, restabelecer a Face de Cristo nos irmãos". Assim explicava, com poucas palavras mas intensas, às jovens Irmãs, o carisma das religiosas da Sagrada Face: "Quando um irmão está triste e sofre é nossa tarefa fazer com que o sorriso volte ao seu rosto... Esta é a nossa missão: fazer sorrir o rosto do doce Jesus no rosto do irmão!". 

 Num mundo de pessoas distraídas em relação às coisas eternas é atual como nunca o exemplo esplendoroso da beata Madre Mastena de cujo rosto transparecia, como filigrana, o rosto sorridente de Cristo. Toda a pessoa da Madre Maria Pia estava repleta da presença de Cristo Crucificado e Ressuscitado, de maneira evidentemente superabundante, a ponto de a estimular a servi-lo nos pobres de todos os géneros e a identificar-se na Eucaristia celebrada e adorada. "Muito bem, servo bom e fiel, foste fiel no pouco, muito te confiarei. Entra na alegria do teu senhor" (Mt25, 21). 

 Leia a homilia na íntegra acessando: http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/csaints/documents/rc_con_csaints_doc_20051113_beatificazioni_po.html

quinta-feira, 10 de maio de 2012

"Maria, a flor mais bela da criação!"

"No hemisfério norte, a primavera avança com muitos e coloridos florir; o clima favorece passeios e excursões. Para a Liturgia, maio pertence sempre ao Tempo da Páscoa, o tempo do 'aleluia', do revelar-se o mistério de Cristo na luz da Ressurreição e da fé pascal". Nesses dois contextos, o "natural" e o litúrgico, se insere bem a tradição da Igreja de dedicar o mês de maio à Virgem Maria. Ela, de fato, é a flor mais bela que desabrochou da criação, a "rosa" que apareceu na plenitude do tempo, quando Deus, mandando seu Filho, doou ao mundo uma nova primavera. Maria é, ao mesmo tempo, protagonista, humilde e discreta, dos primeiros passos da comunidade cristã: Ela é o seu coração espiritual, porque a sua presença em meio aos discípulos é memória viva do Senhor Jesus e penhor do dom do seu Espírito.
"Se alguém me ama, guardará minha palavra e o meu Pai o amará e a ele viremos e nele estabeleceremos morada" (Jo 14,23). Essas expressões são dirigidas aos discípulos, mas podem ser aplicadas em máximo grau justamente Àquela que é a primeira e perfeita discípula de Jesus. "De fato, Maria observou primeira e plenamente a palavra do seu Filho, demonstrando assim de amá-lo não somente como mãe, mas primeiramente como serva humilde e obediente."
No seu coração, Maria meditava e interpretava fielmente tudo aquilo que o seu Filho dizia e fazia. Deste modo, já antes e, sobretudo, depois da Páscoa, a Mãe de Jesus se tornou também a Mãe e o modelo da Igreja". (Bento XVI)
Maria, mãe de Jesus e nossa, rogai por nós!

Eis aí tua MÃE!

domingo, 1 de abril de 2012


Bolívia de muitas culturas e cores…
Discorrer sobre a Bolívia não me parece uma tarefa muito fácil. Bolívia é uma terra de muitas culturas, cores e línguas…um país que poderia ter como lema: unidade na diversidade.
Diversa é sua natureza física, dividida em terras andinas, altiplano e terras baixas. Cada uma delas se subdivide em departamentos[1]. Nós, Religiosas da Sagrada Face, estamos inseridas no departamento de Cochabamba, num município denominado Tolata, distante 35,7 km da cidade de Cochabamba. Os povos que habitam estas terras possuem culturas, línguas e visões de mundo distintos. As linhas vinduoras tratam deste assunto.
Antes da Colonizacao Europeia, toda a Região andina da Bolívia, fazia parte do Império Inca, o maior império da era pré-colombiana. Este império abrangia várias nacões e mais de 700 idiomas diferentes, sendo o mais falado, o quíchua. Muitas expressões desta cultura podem sem encontradas em toda Bolívia.
A cultura boliviana resulta da fusão entre as culturas inca e hispanica. No entanto, os 38 grupos etnicos[2] conservam fortemente os tracos de  seus ancestrais presentes nas vestimentas, nas suas tradicoes, nas linguas e visoes de mundo, apresentando fortemente influências indígenas, vivenciadas em sua ligacão com a terra e a natureza.
O povo mojeño, por exemplo, traz em si o sentido da harmonia do cosmo: o universo pertence a todos e a convivência pacífica se impõe pelo respeito a tudo o que é criado. Neste cosmo cheio de vida, todos têm o mesmo direito e os mesmo deveres.
“La paz y la justcia se han abrazado… El señor mismo dará la felicidad y dara sus frutos nuestra tierra. La rectitud andará delante de el, la paz irá seguiendo sus pisadas”
Para os mojeños, há um Ser ou Amo Supremo, chamado Maimuna, que coordena todo o universo. E há também um espírito do mal, chamado Éreana. Falam também de espíritos cuidadores (Duenos), que estão mais próximos da vida diária, entre eles os dos bosques, das águas e ainda o tigre, como dueno de todos os animais do bosque.  
Assim, o povo mojeño nunca caca ou  extrai madeira sem que antes tenha pedido permissão aos espíritos do bosque para fazê-lo. Acreditam que se uma pessoa se exceder na caça ou no corte de madeira, serao acometidos de muitos males enviados pelos espíritos do bosque.
Outro ascpecto cultural dos povos mojeños é o fato de existir na comunidade pessoas que buscam manter a harmonia entre os membros da comunidade, dando-lhes conselhos. O Járauki, que significa: “aquele que tem as vistas claras”, normalmente mora um pouco distante do povoado, o que lhe permite aconselhar com aquele olhar de fora.
Outro aspecto significativo está no fato de receberem um nome, homônimo ao de um ancião ou anciã. É costume, quando alguém passa por dificuldades procurar o seu Tocayo (aquele ancião ou anciã que tem o seu nome) para encontrar ajuda. O Tocayo tem obrigação de acolhê-lo e de cuidar desta pessoa.
A(s) cultura(s) boliviana sao diversas, mas guardam aslguns aspectos que são semelhancas entre si. A ligação com a terra que denominam de PACHAMAMA, é uma delas. É a Pachamama que os favorece com o bens para viverem… a ela oferecem oferendas e realizam ritos em agradecimento por suas dádivas. A ela, oferecem os primeiros frutos da colheita…
Eis um pouco dessa cultura tao rica… que possamos olhá-la com humildade para percebermos nela a presenca de Deus.
                                          Comunidade de Tolata, Bolívia


[1] Os Departamentos sao Beni, Cochabamba, Chuquisaca, La Paz, Oruru, Pando, Potosí, Santa Cruz e Tarija.
[2] Os principais grupos etnicos, por quantidade populacional, sao: Quechua, Aymara, Chiquitano, Guarani e Mojeño.

sábado, 31 de março de 2012

Tua Face

"Tua Face, Deus de amor,
É minha herança para sempre.
Ela é meu único tesouro.
Nela pousam os meus olhos.
Nela o meu coração.

A Ela "minhas afetousas reparações".
Para Ela os instantes de minha existência.
Nela, mergulhar, quero;
Nela, perder-me, desejo.
Junto dela meu coração se aninha,
Escondendo-me, Nela vivo.

A ti, ó Sagrada Face,
Meu amor eu te consagro.
No ímpeto do desejo
A Ti meu coração se lança.
Ó Face do meu Amado!
Ó Face mil vezes santa!

 Ó Beleza infinita
Tão antiga e tão nova.
Atraes com um único de teus olhares!
Por isso as virgens te amam:
És a mais Bela Face entre os filhos dos homens!

Como não haveria de te amar
Se tu me atraes a todo instante?
Ó Face amada, ó Face adorável
Face que eu amo!
...
Ao assumir a nossa natureza
Assumes a face do homem que um dia
Pelo pecado ser Deus desejou
E a imagem divina desfigurou.

Ó Jesus, tu assumes esse rosto
E o reparas com mui terno amor.
Vais modelando, dando-lhe novos contornos
Restabelecendo a Face do Amor.

Foi na Sexta-feira Santa
Que tua Face tão bela e atraente,
Perdeu de humano a aparência,
Causando espanto àquela gente.

A Face, antes, tão linda,
Agora vemos chagada e escarnecida,
Insultada e esbofeteada;
Face ferida e desolada.

Onde está a Face do Homem?
Onde a Face de Deus?
Onde se esconde a Face adorável?
Quero encontrar a Face do Amado!

Ah, Jesus, fitando esta Face ensaguentada
Olhando com ternura e amor
Percebo os traços delineados
Do Filho de Deus feito homem.

Por trás das feridas e golpes
Encontro o Amor que me amou,
Entregando-se, deu-se aos homens
Mas só encontrou desamor.

Sim, Face que amo és Tu
Que eu contemplo desfigurada.
És Tu a beleza, agora escondida,
A Beleza de um Deus que me deu sua vida".
(Sagrada Face)


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Cochabamba - Terra de missão!

Querida fundadora, Maria Pia Mastena, o teu sonho de que a Face de Jesus seja irradiada em toda parte da terra ganha novo ardor com a partida das primeiras irmãs para este solo sagrado, onde o teu coração, um dia sonhou, em pousar, mas os caminhos e o tempo de Deus nem sempre coincidem com os nossos, assim, o teu desejo, alimentado há tantos anos, finalmente ganha cor, ganha vida e se faz missão! Certamente tu não sossegaste até convencer a Jesus de que ali era necessária uma missão dedicada à sua Face Sagrada. Como mulher forte, tu deves ter insistido, persistido e assim, ganhaste os favores do teu Doce Esposo, que não pode deixar de atender à esposa amada, afinal, o teu pedido é para que a Sua Face transfigurada pelas consagradas a ela dedicadas, resplandeça em cada rosto do povo boliviano. Obrigada, amada Fundadora, pelo cuidado que dispensas ao teu querido jardim, a tua família religiosa, a tuas filhas. Obrigada porque continuas, do céu, a dirigir cada passo, cada obra, cada ato que fazemos por amor ao teu, ao nosso Esposo Celeste. Obrigada, Mãe querida, pela tua insistência ante teu Esposo, pela missão que confias a cada uma de nós, tuas filhas, porque acreditas que podemos ir mais longe do que jamais imaginamos. Obrigada, Beata, porque apostas em nós, apesar de nossa fragilidade, apesar de nossos limites, até porque tu não levas em conta o que nos falta, mas o que temos para colaborar na construção do Reino de Deus. Mil vezes obrigada, porque abres para nós um novo tempo, tempo de esperança, de renovação, de júbilo. Sim, com certeza, tu vais à nossa frente, como mãe, como provedora, estás na árdua tarefa de prover o necessário às tuas filhas, que já estão em solo missionário. Como missionária, caminhas lado a lado com tuas filhas em cada missão que desempenham. Peço-te, mãe amada, que dês às nossas irmãs a força e a coragem que tiveste enquanto vivias entre nós, e que agora elas precisam para fazerem o rosto de Jesus sorrir em cada face desfigurada pela dor, pela miséria, pelo abandono, pelas drogas, pela violência, pela desvalorização da pessoa humana. Obrigada, Ir. Graça, Ir. Maria Fifi, Ir. Odete pelo sim, pela disponibilidade, pela doação da vida nesta nossa nova missão. Madre Maria Pia Mastena, rogai por nós!